terça-feira, 21 de julho de 2009

Do grão ao bilhão



De grão em grão a galinha enche o papo. Você já ouviu esse dito popular, não é?
Convidei o deputado Índio da Costa, DEM-RJ, para escrever nas Iscas Intelectuais de meu site, pois admiro o trabalho que ele vem fazendo para profissionalizar o processo de tomada de decisão na administração municipal. Decisões baseadas em fatos, coisa rara na política de balcão de trocas de hoje. Em um dos textos do deputado tomei contato com o Relatório Paralelo da CPMI dos Cartões Corporativos, escrito por ele. Já na "Síntese dos fatos" que abre o relatório, tive uma idéia de como a estratégia da falta de transparência serve a interesses escusos. A Comissão lidou com a má vontade dos envolvidos, com atrasos, documentos misturados, faltantes, incompletos, todo tipo de dificuldade para atrapalhar a investigação. E então aparece o registro de como o Controlador Geral da União, Ministro Jorge Hage Sobrinho, se manifestou à CPMI sobre os gastos com o Cartão de Pagamento do Governo Federal:
"... O percentual do que representam hoje os suprimentos de fundos no total das despesas correntes, é muito pouco significativo, em termos quantitativos. Eles correspondem a 0,027% do total, por exemplo, no ano, em 2007, das despesas correntes. (...) Foram 177 milhões, num total de 625 bilhões. O que não significa que mereça uma atenção."
Pois é. O que o Ministro quer dizer é que uma goteira nada significa se a caixa d'água tiver 10 mil litros...
Imediatamente lembrei-me do Manual de Combate à Corrupção nas Prefeituras, elaborado com base na experiência de cidadãos independentes da cidade de Ribeirão Bonito, que conseguiram derrubar o prefeito corrupto. Quando o manual trata dos "valores redondos ou próximos de R$ 8mil", diz assim:
"A Prefeitura pode adquirir bens e serviços por meio do procedimento de carta-convite, quando se trata de gastos de até R$ 80 mil reais ao ano. A partir desse valor, é obrigatória a abertura de licitação em uma modalidade mais complexa e exigente, a tomada de preços. Porém, serviços e compras (...) com valor de até 10% do limite de R$ 80 mil, isto é, R$ 8 mil, estão desobrigados de licitação (...) e podem ser realizados de uma só vez. Há indícios de atos ilegais quando se verifica que há muitas notas fiscais próximas do limite de R$ 8 mil. Isso pode significar que, para maximizar a subtração de recursos, os autores procurem emitir notas com valores próximos do limite, ou estejam fracionando as compras para tentar burlar o limite de R$ 8.000,00 para compras individualizadas, o que é vedado pela Lei 8.666/93."
Hummm... Acho que o Ministro não leu o manual. Parece que ele não sabe que de grão em grão, não sei bem que bicho, vai enchendo o papo.
Ê Brasil, viu? Quando a autoridade desdenha do problema, abre-se espaço para que os 8 mil ou os 177 milhões sejam tratados como irrelevantes. E de grão em grão chegamos ao bilhão.
O relatório paralelo da CPMI dos Cartões Corporativos está disponível em http://tinyurl.com/nlxn52 como um arquivo PDF anexado a um comentário meu no fórum de debates.
O Manual de Combate à Corrupção nas Prefeituras está em http://tinyurl.com/mkkabn da mesma forma.
Vale a pena baixar e ler os dois documentos e sonhar com a possibilidade de que nem tudo possa estar perdido. Tem gente tentando controlar os grãos que o tal bicho come.
Luciano Pires
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